SE EU FOSSE HILDA HILST
se eu fosse Hilda Hilst
faria pra você um lindo poema
mas louco e sabendo do amor tão pouco
seria meu outro o dilema
se eu fosse Hilda Hilst
e de terríveis asas a cantilena
porque de silvos caminhará o torto
cortando os pulsos pelas algemas
se eu fosse Hilda Hilst
ou a chuva que tristíssima desaba
ou o sol que atravessou de raios o rosto
do meu fantasma que me aguarda
se eu fosse Hilda Hilst
íris coruscante da fresta-palavra
seria de cinzas, porque eu estava morto
no luto que não tarda e o cão ladra
se eu fosse Hilda Hilst
e o amanhã na minha flauta
e ao dizer ‘o veneno do seu corpo’
não soaria barata a cantata
se eu fosse Hilda Hilst
ou a capela, um solo, uma sonata
e por só ser seria menos que um sopro
assim a dor se basta, inexata
Que delicadezas tocarão o meu olhar?
Sei de verdes ventos que ecoam tristes.
Por estas montanhas o mar distante eu sonhei
e inventei novos segredos para as palavras.
Do veludo crepúsculo já vi chorar
o sol nas tardes. E sim! Por estas colinas
selvagem o meu cavalo sombrio rindo
sabia calar as velhas pastagens das vacas.
Ah! Os mesmos homens empestados e vorazes,
fediam a álcool, cigarro e a muitos outros homens.
São estes, bem vejam, os intratáveis ruminantes.
Eu veloz dentro da noite silencio antes,
espreito as passagens dos que ainda dormem,
disfarço meu retrato. Eu sou paisagens.
Opinião ambulando, som procurando
sombra e água fresca. Chuva que Deus dá,
Deus dará, Deus aos seus sempre dá,
tem mais Deus nos deuses meus que o dia pra tirar.
Alimentem nosso mais muito mais,
vinho tinto que se brinda sobre a mesa,
escorre entre os dedos o banquete de usura,
todo mundo é pedra que um dia a cerca fura.
As janelas voam de dentro das casas,
porta que se abre sem parede
se você tem sede, se você tem sede
não importa a porca sem rosca,
se rosa é boca a boca, se toda prosa é pouca,
se a vontade é mesmo louca se você vem...
Se falsos profetas de fina estampa
esparramam em ramos rimas rimos...
E pouco importa o pau oco da santa,
o ritmo saltimbanco que assistimos.
Livre a poética acaba um dia tísica.
Alegoria é pra gringos e propinas,
o ovo da gema, o corvo-ema, a física.
A sabedoria atalho por Minas.
Outras fantasias mantêm meu carnaval;
aos poucos, revelo-me o fim do estio.
Por nadar o nadador nada igual!
Soubesse eu o fio-cio do mio no mio,
lançava o gato escaldado seu vau,
cobra diante do pedaço de pau.
ANTES DE DORMIR
Eu desentendi a grande estrada
Pura desilusão. E efeito
sonoro teorema do nada.
A fala longe do conceito.
Tudo meta, mas sem o problema
Lengalenga ímã e cacete..
Estilo drama de cinema:
Alheia a lágrima, salve o enfeite.
Esse depois dos trinta e dois,
trinta e três do segundo tempo...
E se percebe: não tem nós dois!
Cansei de ser vento. Não vento
Sou silêncio que desalinha.
Pobre lua. Jamais será minha.
ELES DORMEM
O povo
não sabe
do choro
do poeta
não sabe
como as palavras
que pareciam doces
tornaram-se ásperas
O poeta
não sabe
do povo
que chora
não sabe
dos seus tormentos
por mais sinceros
seus sentimentos
O homem
chora
por despedir-se
do agora
mastiga e ora
e pede por águas
inverno e colheita
depois se deita
O povo
dorme
de barriga a meia
seu verbo
odeia a roda
o violão na praça
ah, seus sonhos de sobras
roncos de ideias e obras
O poeta
se cobre
sua lança na veia
não fere
ode ao pódio
desfere seu corte
mas prefere as garras
das palavras leopardas
2 comentários:
genial! magnífica composição!
se eu fosse Hilda Hilst
beberia até acabar meus dias
sem medo de me (ar)riscar
abriria uma letra, e
faria um strip tease...
Bravo, poeta!!!
Beijos!!!
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