INFINITO BERRANTE
O palco é um grito! Um aaaaaaaaaa
do seu sem direção. E você não pode
ter medo de gritar e soltar você
gigante. Você: infinito berrante!
De muitos infernos vem a vida.
Faminta e voraz sobre o já feito,
o já vivido. A vida é inventada
em todo canto ecoando distante
E as flores estão dispersas de amor
daqui de lá o homem nasceu pra amar
e depois morrer de amar o amor
morrer de cantar a dor de amar o amor
Porque amantes nós somos mágicos
mas amando nos tornamos trágicos
TALHE ETERNO
‘Há sempre algo de ausente que me atormenta’
(Camille Claudel)
Toma meu corpo, meu amor, a teus pés!
A eles, sim, dedico esta canção.
Quanto do que sou, se sou, tanto és,
por beijar-lhes suave como às mãos.
Hei de sonhá-los e assim esculpir
o movimento a cor a linha.
Algo que há neles... Parecem rir,
mas a dura pedra não adivinha.
Nem ouve o apelo irmão do vento:
- Tão logo chegará rigoroso inverno.
Segue o teu caminho, esquece o tempo,
pois só a velha lama verde do brejo,
caminho das almas no esquecimento,
fabricaria seu talhe eterno!
UM GUARDA-CHUVA
Um guarda-chuva
esquecido no banco
vazio da igreja.
Um guarda-chuva
sem chuva sem sol.
De joelhos a pressa
já cumpre a promessa
e o mérito da graça.
Que tolo! O beato
nada sabe da praça.
Um guarda-chuva
que triste ri
no santo encosto.
Rei morto, rei posto.
PALHAÇO DE DEUS
“Eu sou palhaço de Deus”
Vaslav Nijinsky
Quando a graça e o riso
no espelho despida face
a musculatura os ossos
em partes o seu disfarce
não grite ao gozo da carne
o arrepio nos ombros
guarde dentro dos seus olhos
o silêncio dos assombros
E quando puser a dor
na mesa a vida vazia
e entre migalhas o amor
beber, rir, erguer o braço:
poesia! poesia! poesia!
lágrimas de um palhaço.
CALEIDOSCÓPIO
Um pássaro longe,
dispersa canção...
E é só um som presente
na arrebentação.
Vem dali o futuro!
Depois bateu a porta
e está solto e tudo
voa em volta da volta:
dançarino tango,
a dor em cuidado,
ondas ao oceano...
E o tempo não existe;
às vezes, passado,
e ainda nos assiste.
SONETO PARA O BISPO DO ROSÁRIO
A última foi mais de dez mil. Assim!
Mas insiste o mundo ainda bem vivo
como as cartas de um velho baralho.
Eu construo um muro com cacos de vidro.
Que importa tenhamos lembranças tolas?
Respiro o passado. Não há futuro.
Vejo as flores, suplicantes montanhas,
descampados à tarde. Eu não me iludo.
Quando estamos perdidos nada de fato
possuímos. Sorrimos inchados da manhã,
a fome é um desequilíbrio no prato.
Pânico solar, qual o quê? Humanos!
Estamos aí como que em suspenso...
Você olha. Eu não existo. Eu não penso.
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