terça-feira, 12 de dezembro de 2017
O FABULOSO
Ouvi a história
do senhor do vento
Que resolveu
beber a água do mar
E ainda domar o
maior sentimento
Sem assim seu
coração se entregar
Queria ele
possuidor da coisa insana
Ver tudo! As
estrelas da noite ao porvir
E ir além da
escura condição humana
Varrer o tecido
marítimo! Descobrir!
Saber onde Deus
de infinita costura
Tinha guardado o
restante do pano
Da terra em
retalhos até a sua altura
O vento velejava
só a sua procura
Nele o verde das
águas era seda puradomingo, 3 de dezembro de 2017
UMA NOITE COM RIMBAUD
‘A
Grande Ursa,
O meu albergue, brilhava no céu escuro.’
Rimbaud
O poeta-escultor:
- E só não dá certo
se você tem pressa.
Depois é importante
reconhecer o errado,
vale a caminhada
e não dar em nada.
História de um dia.
Uma noite apenas,
e por um momento
só, vejo a madrugada...
Mais uma, hilária,
e desta pilhéria
tenho a melhor piada.
Pensava-se eterno
e é breve esquecer.
Conflito, dilema...
Nem santo ou promessa,
eu seguirei incerto,
não espero o amor.
Viver é durante.
Se esqueço o passado,
assim do futuro,
bolso tenho do furo.
Vento frio por dentro
que queima minha pele.
Uma noite apenas
e ergue-se o poema.
Agora é tarde, Inês é morta!
HISTÓRIA DA RAINHA MORTA
‘De noite, em doces sonhos que mentiam,
de dia, em pensamentos que voavam’.
Camões
que a vida ela só conheceu plebeia:
de Castela para Portugal vinha
sem o oráculo que nos adivinha,
entre as brancas flores sem ter
ideia
sonhar solitária feito azaleia.
Ah! O Amor em peito tão juvenil!
De sorte, e ainda assim, um
triste engano.
Se maior, o reverso lado é mais
vil.
Sim, uma rainha morta no covil!
Desenredo de quem se fez tirano,
as mãos reais banhadas em sangue
humano.
Tirar Inês ao mundo determina!
O povo cochicha veredicto desejo;
- A mundana bem merece a sina!
(E os filhos?) A sentença ensina:
nos campos de batalha e além
sobejo
os ratos se incumbem do despejo.
Muitos desembainharam a mesma
espada!
A inveja sabe forjar os
impostores
que intempestivos nos roubam a
fábula.
Se houve silêncio não se ouviu
mais nada:
o sangue correu entre as brancas
flores
manchando pra sempre os brutais
atores.
‘De noite, em doces sonhos que mentiam,
de dia, em pensamentos que voavam’.
Não direi coisas que eles não
sabiam.
Morreram todos que escondidos
riam:
enquanto os assassinos a
açoitavam,
ela lembrava os versos que juntos
cantavam...
Mas, eis o príncipe, e a coroa
dela,
e um amor onde a espada não
corta.
O seio da flor, que branco lhe
deu donzela,
exala o perfume que a fez mais
bela...
Tantas muralhas e nem uma
porta:
- Agora é tarde, Inês é morta!
SONETO PARA ADÉLIA PRADO
De algum refinamento seremos todos escravos
Mesmo os mais rudes
homens cheirando às pescarias
Arrogando orgulhosos
os silêncios dos parvos
Em suas histórias de
astutos ressaltam poesias:
- O lambari
atravessou o ar feito um relâmpago!
Era noite dentro de
treva e a luz a espera
Se entre os fracos
aviltamos a voz ao escândalo
Às vezes do mato
respira o medo, nossa fera
Mesmo que a palavra
não seja mesmo de luxo
E o pelejador ainda
assim alimente o seu custo
Pra justificar o
roubo aos deuses inumeráveis
- Eu vi a mãe d’água
e jamais vou esquecer seu canto
Se eu pesco larvas,
desconverso fantasmas, meu tanto...
Entre rãs
sobressaltadas as musas são impecáveis!sábado, 2 de dezembro de 2017
DESCONSTRUINDO ÉDIPO
Trago minhas mãos feridas
Busco liberdade, poesia
De fato não quero nada
Só calar a voz com música
Já que só encontrei a Dor
Veio me avisar o amanhã
E a minha mãe repetindo
Silêncio depois palavra
A outra era bem mais jovem
Mas sabia de eternidades
Reverberando tristezas...
Dizia: - Água, por favor, água!
Faziam o quê ali? Agora
Elas se confundiam
E juro, tinham a mesma voz:
- Tua cabeça está ferida;
mãos e pés sangram. Nem sentes!
Venho do deserto do teu sono
pra acordá-lo deste pântano
Junta tuas coisas e partes.
Minha irmã vivia consigo
Conhecia as noites de tantas
- Não podes ficar aqui!
Acorde! Nosso pai morreu!
O PAI ESTÁ MORTO! O PAI!
Definitiva e materna
Minha mãe inconformada
Implorando estrelas, viúva
Jogou-se uma vez aos meus olhos
- Não fujas mais dos teus sonhos!
E de novo a outra entre nós
Protegendo-me desafiava:
- Pobre criatura infeliz,
pode um homem fugir da dor
se ele já nasce culpado?
Só uma mulher achar que um
homem
caminha impunemente.
Assim um homem não caminha!
O homem é triste e mal goza
os segundos de prazer.
(Como um touro indomável
caminhei preso na arena:
Na sede de Madalena,
lágrimas. No riso de Evas
entre relâmpagos, trevas)
Depois sem que eu dissesse
Falou triste respondendo:
- Quando o corpo se afeiçoa
ao algoz que se aproxima,
eu já não posso ajudá-lo.
- Espere! Não me abandone!
Eu sou culpado! Minha culpa!
Sim! Meu pai era o general
Mal lhe conhecia, bem mal.
Negro sonho de menino.
- Qual o filho não amou sua mãe
e por ela matou o pai?
Nem conheces vosso pai!
Foi que apontou para o corpo.
- O que vês é um impostor!
Aproximei-me do corpo
e estranhamente toquei vestes,
medalhas. A vida é breve,
a morte, bem, não existe.
Já não estamos todos mortos?
Assim de areia e tempo ela
De guarda então se rompeu
Na ampulheta do mistério
A velha do chão viva
E dos trapos da batalha
- Meu filho, agora sou tua!
Vem! E possuas o meu corpo
pra que se cumpra a desgraça!
Podes ver nua a minha alma,
pois sou a primeira mulher!
Ela sabia que eu sabia que ela
Me engolia, me partia e dava
Me comia e me cagava
Me limpava e me paria
E ela ria, ria das mulheres
De repente amaldiçoava
Jogava na cara coisas
Eu decidido em partir
Sem mais existir o dia
- Vai fugir dos teus gerados?
Teus filhos são teus irmãos!
- Qual o filho não amou sua mãe
e assim seu pai não matou?
Os meus olhos bem vejam
ainda brilham em minhas mãos!quarta-feira, 15 de novembro de 2017
GENTILEZA GERA
Gentileza
gera gentileza
gera sorriso gera afeto
Gente
é quase sempre
o medo do desconhecido
o medo do desconhecido
A
ponte da sua mão
ou o muro do abraço
ou o muro do abraço
Se
passar indiferente
Ser o ser mais corrosivo
Ser o ser mais corrosivo
Nem
todos os urânios
Gentileza
não tem tamanho
gente é mesmo estranho
gente é mesmo estranho
Mas
vem algo de repente
insistindo que somos humanos
Gentilezas
geram gerâniosinsistindo que somos humanos
terça-feira, 14 de novembro de 2017
quarta-feira, 1 de novembro de 2017
DE CERTO
Eu
confio nas pedras
Bem
longe das mãos
Prefiro
estar sobre elas
Sob
os pés ou deitado
Eu
confio no sonho
Que
não é lembrado
Não
será lembrado
Será
somente sonhado
Eu
confio nos sábios
No
silêncio dos lábios
Eu
confio porque confio
Naquilo
que nem sei
Eu
confio nos signos
E
mesmo em crenças
Como
a tecer um fio
Que
de certo já rezei
Eu
confio e não há nada
Mais
bonito nem tigre
Nem
águia nem cavalo
Acima
de todas as manadas
Eu
confio no que é rio
A
fonte do nosso oceano
Repara:
não há cor
Na
alma nem nas lágrimas
Eu
confio na poesia
Que
adia o dia dia-a-dia
A
música desse cansaço
Em
notas renhidas
Eu
confio nas vidas
Das
mil e uma vividas
Vestidas
em uma só
De
dobras e despedidas
Eu
confio na palavra
Dada
ou abandonada
Dobro
minha prosa
E
aceito essa canção
Eu
confio em tudo e não
Vejo
as flores e espinhos
Delirantes
noites e vinhos
Que
humanamente são
Eu
confio sem esperar
Sem
ao menos esperança
Nas
frontes encosto o gelo
Derretendo
no terraço
Eu
confio. Pode acreditar
Tudo
passou assim
Como
tudo passa no fim
Também
eu passo
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